E mais uma vez, você me assalta.
Hoje faz 16 anos que eu perdi minha mãe e estou a anos luz do que eu poderia considerar superação para este fato.
E amanhã, dia 4, faz 4 meses que você nos deixou aqui nessa terra de ninguém. Esse mês tá brabo o negócio, porque acaba um dia ruim e nasce outro, cheio de lembranças ora boas, ora doloridas.
"Por que Deus permite que as mães vão-se embora?" - perguntava Drummond e ele com certeza morreu sem saber. Morreremos todos. Mesmo os mais evoluídos de espírito. Porque ao olhos meramente humanos, isso é uma sacanagem, com todo o perdão da palavra.
Eu tive o privilégio de ter várias grandes mulheres ao longo da minha criação. A maioria está viva, cheia de graça, gozando saúde. Mas a mais importante se foi antes que eu até me alfabetizasse, o que foi muito cruel, já que escrever é maneira que eu acho mais adequada de colocar meus sentimentos para fora. Vacilo eu não saber fazer isso naquela época e ficar com a coisa entalada em mim até poder, finalmente, tornar legíveis as minhas revoltas, meus questionamentos e tudo aquilo que eu entendia que era necessário por algum motivo, mas que eu na realidade, achava uma sacanagem muito grande contra uma criança que não sabia se defender.
E agora, dessa vez, com 21 anos nas costas, cursando uma faculdade de Letras e após chutar esta, recomeçar do zero no Direito, me reservei o direito de ficar sem palavras.
Há 4 meses perdi uma mulher que vinha sendo fundamental no meu crescimento. E eu diria que nós nunca convivemos tanto como do dia 4 de Setembro para cá. Todos os dias ela me assalta os pensamentos, vem em alguma lembrança boa("-Tia, eu tô trabalhando hoje./-E aí, já ficou rica?/-Hahahahaha, ainda não!/-Gostei do AINDA!"), dou risada de alguma coisa curiosa ou lembrando as altas risadas que dávamos juntas ("-Minha filha, você precisa controlar a sua gargalhada. Homem corre de mulher que ri muito alto!"), me surpreendo com a proteção que ela dedicava à mim ("-Pra quê você vai comer sobremesa?Tem necessidade?São onze da noite!"), com os comentários hilários dela ("-Olha como fica ridículo quando a mulher é mais alta que o homem!" ou o inesquecível "-Aquele ali...é viado?"), com o entusiasmo dela para determinados assuntos meus ("-Me contaaaaaaa!"), com a precaução dela ("-Vou ligar pro meu amigo da Barra e ver se lá tem sol, peraí!"),com os conselhos ("-Faz o favor de comprar uma roupa para alguém da sua idade!") - os dela eram os melhores dentre todos os que recebo dos maiores de 50 anos, praticamente. E era para ela que quase sempre eu corria, quando a coisa apertava ("-Dindaaaaaaa!!" e em geral eu ouvia um "-Tenha calma, em primeiro lugar.")
Era era parceira, (fada)madrinha, tia, mãe e principalmente amiga. Dava umas broncas que, sai de baixo, mas faziam pensar ("-Eu tô te dizendo isso para que você pense, antes que aconteça de novo!" ou ainda "-Como é que você foge para Brasília e não fala pra sua dinda?"). Ela nunca me deixava com raiva. E eu tinha toda a liberdade com ela para ser sincera, genuína("-Tia, eu te trouxe um chocolate da viagem, mas eu comi. Só sobrou o whisky!")
Acho que a identificação era tanta, porque talvez ela contivesse em toda a sua essência, coisas que haviam na minha própria mãe -de verdade ou imaginadas na minha cabeça.
Fato é que quando ela se foi, eu morri um pouquinho também.
E acho que ela volta, que vai ligar, que amanhã vamos à praia.
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